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Quanto custava um brasão no Império?

Há alguns dias, no Grupo do Facebook, perguntaram sobre o brasão de um nobre do Império. E em busca desta resposta, tropeçamos num dado interessante, sobre o qual decidimos nos debruçar hoje. A verdade é que no império, a Heráldica não era concedida a título gracioso, e nem todo nobre registrou armas para o seu título, pois não custava barato.

Em 1860, o registro de um brasão podia custar o equivalente até quase 600 mil réis, ou 600 gramas de ouro.

Fazendo a conta com o valor do preço do ouro nos dias de hoje, é uma soma astronômica, de fato. Há, sem dúvida, inúmeros fatores que temos que considerar aqui, entre eles a inflação, o preço do ouro, etc. etc. Mas eu deixo esses fatos econômicos para quem puder melhor tratar deles. Por ora, trabalharei com os dados coletados por Anibal de Almeida Fernandes, 4º neto do Barão de Cajuru, que nos traz algumas informações sobre a economia em seu “Estudo comparativo entre quatro fortunas do Império Brasileiro na década de 1860” (2011):

O primeiro dado para o qual atentamos é que “em 1860, 1 conto de réis (1:000$000=1 milhão de réis) comprava 1 kg. de ouro” e “para ser nomeado Senador do Império o interessado tinha que comprovar uma renda anual de 800$000.” Guardemos esta localização histórica e temporal.

O número de nobres sem brasão (como o Barão de Croatá) no Archivo Nobiliarchico Brasileiro supera por muito o de nobres armígeros.

Para não nos fixarmos no padrão-ouro, buscamos um outro estudo, que tratasse de valores. Um excerto da “Evolução dos preços e do padrão de vida no Rio de Janeiro, 1820-1930” (1971), da Revista Brasileira de Economia (FGV), nos apresenta alguns salários anuais: Um imigrante trabalhando numa fábrica de velas ganhava 10 mil réis mensais (em 1861), um Mestre Pedreiro livre ganhava 44.120 réis mensais(em 1863). Um professor de primeiras letras aprovado em concurso, no melhor dos casos, ganhava pouco mais que 40 mil réis mensais (500$000 anuais, de acordo com a Lei das Escolas de Primeiras Letras, de 1827).

O valor da carta de brasão era mais de dez vezes isso

Pedro Moniz de Aragão, diretor do Arquivo Nacional responsável por publicar o ‘Catálogo da Exposição de Modelos de Brasões e de Cartas de Nobreza e Fidalguia (1965), conta-nos:

“Segundo folha impressa, apensada ao Armorial Brasiliense de Luís Aleixo Boulanger, datada de 2 de Abril de 1860, eram os seguintes os preços então cobrados:”

Requerimento a S.M. O Imperador e passos a respeito: 30$000

Pergaminho (para álbum de quatro folhas): 32$000

Carta de Nobreza e Fidalguia:
Caracteres dourados: 180$000
Cópia das armas para a Secretaria do Império: 25$000
Dito, para o arquivo: 25$000
Composição de Armas Novas, conforme os preceitos da ciência: 25$000
Heráldica: 25$000
Encadernação em veudo: 50$000

Despesas Fixas:
Escrevente do Cartório da Nobreza: 40$000
Despacho à Secretaria do Império: 10$000
Emolumentos do Escrivão da Nobreza e Fidalguia: 50$000
Ditos do Rei de Armas: 50$000
Para Direitos no Tesouro: 20$000
Selo da Carta de Nobreza: 30$000

O total, para uma certificação completa, seria, portanto, de 592$000. Em baixo, sob uma linha à guisa supostamente de soma, aparece a importância de 366$000. A diferença pode se referir a custos relativos à carta, possivelmente às letras douradas e à encadernação em veludo, que somadas custariam 230 mil réis. Na Biblioteca do Heráldica Brasil, por exemplo, encontra-se a Carta de Brasão da Baronesa de Sertório, que possui uma capa aveludada, mas não possui letras douradas para além do nome do Imperador. Baseado nestas informações, parece correto afirmar que Boulanger oferecia cartas de brasão mais ou menos elaboradas para os solicitantes.

Uma cópia do Brasão da Baronesa de Sertório, concedido por Luís Aleixo Boulanger, está na Biblioteca do Heráldica Brasil.

Ainda assim, não era nada barato, afinal quem queria um brasão tinha de pagar todos os custos necessários. Fernandes (id.) nos conta, por fim, que dos 986 titulados no Império, apenas 239 tiveram brasões registrados.

Referências

FERNANDES, Anibal de Almeida. Estudo comparativo entre quatro fortunas do Império Brasileiro na década de 1860. 2011. Disponível em: https://www.genealogiahistoria.com.br/index_historia.asp?categoria=4&categoria2=4&subcategoria=56. Acesso em: 5 jun. 2022.

LOBO, Eulalia Maria Lahmeyer et al. Volução dos preços e do padrão de vida no Rio de Janeiro, 1820-1930 – resultados preliminares. Revista Brasileira de Economia, Rio de Janeiro, v. 25, n. 4, p. 235-266, 01 out. 1971. Disponível em: https://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rbe/article/view/67. Acesso em: 05 jun. 2022.

Pedro Moniz de Aragão (org.). Catálogo da Exposição de Modelos de Brasões e de Cartas de Nobreza e Fidalguia: colônia – reino unido – império. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1965.

Jubileu de Diamante da Rainha Elizabeth II

Neste fim de semana, o Reino Unido comemora os setenta anos da coroação da segunda monarca mais longeva da história. A Rainha Elizabeth II chega aos 70 anos de reinado este ano. Está atrás apenas de Luís XIV, o Rei-Sol de França, que reinou por 72 anos e 110 dias.

E foi para esta coroação que as armas do Reino Unido sofreram a sua última modificação. Não no brasão em si, mas no desenho.

As novas “Bestas da Rainha”

Para a coroação de Elizabeth II, na capela de Westminster, em junho de 1952, o Ministério de Obras Públicas do Reino Unido encomendou ao escultor James Woodford uma série de dez esculturas de vários badges (insígnias) reais, que ficaram conhecidas como “As Bestas da Rainha”. Estas esculturas são inspiradas outras, que foram encomendadas pelo rei Henrique VIII, para decorar o seu casamento com Jane Seymour, em 1536.

“As Bestas da Rainha”, Kew Gardens, Richmond. Foto por Ramson.

 

Dentre as esculturas, a mais importante era o Leão da Inglaterra. Sendo a única besta entre as dez que tinha a cabeça coroada, sua função era a de sustentar as armas do Reino Unido. Porém havia algo de diferente. A Historiografia falha em definir se ela é fruto de conversas entre Woodford e o College of Arms, se foi uma pedido do Ministério ou mesmo uma ideia do próprio Woodford, porém o terceiro quartel estava diferente. A Harpa, que representa a Irlanda do Norte como parte integrante do Reino Unido tinha um desenho diferente, mais gaélico.

O novo desenho aproximou as armas do (teórico) Reino da Irlanda (de facto, a Irlanda do Norte) das armas da vizinha República da Irlanda, que por sua vez já não exibiam mais a harpa com cabeça humana e seios à mostra desde o ano de 1922.

Dois anos depois, em 1954, a Rainha expressou sua preferência pela harpa em estilo gaélico. Desde então as armas reais tem sido desenhadas neste estilo. Pode-se notar que a harpa antiga sumiu da maioria dos lugares.

Rainha Elizabeth chegando ao Epsom Derby, em 2015. Note-se a Harpa Gaélica na bandeira e na capota do carro.

Da mesma forma, também não vemos mais a harpa antiga nos brasões concedidos à sua descendência e familiares, que como se sabe, usam brisuras das armas da Rainha, como é o caso do Duque de Sussex e de sua Esposa:

As Armas da Duquesa de Sussex

As armas da Duquesa de Sussex, num escudo partido com as armas de seu marido, neto da Rainha. A harpa não tem um vislumbre de figura humana sequer.

A Heráldica é uma Arte

Porém, algo que não podemos esquecer é que a heráldica é uma linguagem que permite múltiplas representações artísticas do mesmo conceito (o brasão em si). Portanto, independente de como se desenhe a harpa, as armas do Reino Unido (fora da Escócia) seguem as mesmas:

Quarterly, I and IV Gules, three lions passant guardant in pale Or langued and armed Azure. II Or a lion rampant Gules armed and langued Azure within a double tressure flory-counter-flory Gules. III Azure a harp Or stringed Argent.

Esquartelado: I e IV de vermelho, três leões passantes guardantes de ouro, armados e lampassados de azul. II de ouro, um leão rampante de vermelho, armado e lampassado de azul dentro de uma orla dupla flordelisada de vermelho. III de azul, uma harpa de ouro, cordada de prata.

Ou seja, heraldicamente, a harpa de seios de fora não está errada. Vejam a foto do o Garter King of Arms. Já falamos sobre Sir Thomas Woodcock antes. Eu o considero, indubitavelmente, o homem mais importante da heráldica nos nossos dias. No tabardo, vestimenta oficial de sua função, a harpa antiga.

Fonte: Christopher Bellew. Foto por Hugo Rittson Thomas

Ficam as teorias e as especulações sobre a mudança no desenho. Poderia ter sido isto uma tentativa de aproximá-la da harpa da República da Irlanda, seja visando uma reaproximação? Talvez uma forma de estabelecer uma possível reclamação territorial? Ou quem sabe pode ter sido um impulso moralizador da própria rainha, buscando substituir a tão criticada nudez feminina e os tão polêmicos mamilos por uma solução mais pudica?

São pequenos detalhes como estes que fazem a Heráldica ser tão interessante afinal. Ela é, mesmo depois de tantos séculos, uma ciência viva e sujeita às mudanças do mundo.

 

O que é um brasão?

Bem-vindos ao texto básico do Heráldica Brasil: “O que é um brasão?” É um texto um pouquinho mais longo, contudo compreender este conceito é importante para todo estudioso de Heráldica. Se vocês tiverem dúvida sobre qualquer conceito apresentado nesse website, voltem a esse texto e o leiam calmamente, porque se este conceito não ficar claro, muito do blog pode ficar meio nebuloso.

O que é um brasão? é uma pergunta que parece inócua. Tanto que a grande maioria das pessoas passa por toda a vida sem precisar pensar nela. Brasões não são grande coisa nos dias de hoje, pelo menos não para nós. Com a evolução das capacidades militares, carregar um escudo decorado para nos diferenciar não é necessário.

Apontamentos de Heráldica

Eu sou um estudante muito displicente. E um blogueiro ainda mais displicente. Nestes últimos oito ou nove anos em que estou pesquisando sobre brasões, nunca consegui sistematizar muito do meu aprendizado. E esse blog então… Vive bem parado. E já que eu pessoalmente não consigo fazer muito disso, hoje trago-lhes a sugestão de leitura de alguém que consegue: O Miguel Linhares, membro do nosso Grupo no Facebook iniciou no começo do ano um excelente blog, o Apontamentos de Heráldica. Se alguém aqui ainda não conhecia, peço que imediatamente encaminhe-se para a leitura por lá.

Armas do Miguel Linhares, do Blog Apontamentos de Heráldica

 

Sendo um excelente professor e tradutor, o Miguel tem trazido dezenas de conteúdos muito interessantes, que contribuem e muito para o estudo de Heráldica. Em apenas 10 meses de publicação, o blog já tem mais de 140 publicações. É algo que este displicente que vos escreve nem sonha! O Apontamentos de Heráldica se tornou rapidamente o meu blog preferido sobre a matéria, porque o autor é um grande estudioso da matéria. A partir da análise e da tradução de armoriais e tratados, especialmente em Latim, sobre Heráldica, o Miguel fornece subsídios valiosos para todos nós, que temos interesse na área.

É uma leitura obrigatória para quem quer aprender mais sobre isso!

Um brilhante manuscrito

Primeiramente, quero desejar um feliz ano novo a todos vocês! Estamos começando mais um ano no Heráldica Brasil, que será de muitos planos, ideias para colocar em prática, novidades na biblioteca e muito mais! Para iniciar o ano, teremos algo bem especial. Vamos passar por Roma, por Portugal, pela Índia e vamos até o Japão com um único manuscrito.

Encontrei um belíssimo manuscrito entre as minhas antigas publicações na página do Facebook. Olhando-o novamente, percebi que estava deixando passar não só um belíssimo documento histórico, mas uma peça heráldica de valor inestimável.

Carta do Vice-Rei da Índia, Duarte de Meneses, ao Daimyō do Japão, Toyotomi Hodeyoshi
O Manuscrito de Meneses a Hideyoshi.

Ao mui alto e poderoso Kwambaku-dono, (escreve) Dom Duarte, Vice-Rei da Índia.

Como quer que pela distância das terras não houve até agora entre nós comunicação, todavia pelas cartas dos padres que estão nesses reinos de Vossa Alteza soube a grandeza de vossas vitórias e obras e a fama e nome, que ainda nas partes que estão mui longe se ouve de Vossa Alteza e como sujeitou a seu império os maiores senhores e reinos das quatro partes do Japão, coisa que nunca fora ouvida desde os antigos até agora, o que sem dúvida é admirável o favor do céu e coisa de grande admiração, de que grandemente me alegro.

Soube também que os padres que estão nestes reinos recebem muitos favores de Vossa Alteza, e com o resplendor de seu favor, vão promulgando, pregando e ensinando a lei para salvar os homens, os quais são religiosos destes reinos dignos de veneração, que conforme a seu instituto passam a todas as partes do mundo para ensinar o verdadeiro caminho da salvação, e ao saber deles os favores que Vossa Alteza lhes faz, me tenho alegrado muito.

E por eles me pedirem que escrevesse a Vossa Alteza, e lhe mandasse um embaixador dando-lhe as graças disto, folguei de o fazer. E porquanto o Padre Visitador estes anos atrás foi outra vez a esses reinos de Vossa Alteza e é conhecido nessa terra, lhe encarreguei esta embaixada, e peço a Vossa Alteza que que daqui em diante mais e mais o queira favorecer. E podendo destes reinos servir a Vossa Alteza em alguma coisa folgarei muito de o fazer.

Em sinal de amor mando a Vossa Alteza dois montantes, dois corpos de armas, dois cavalos com seus arreios, dois pistoletes e um terçado, dois pares de guadamecis dourados e uma tenda para campo.

Feita nestes reinos da Índia no mês de Abril do ano de 1588.

Vice Rei da Índia

Afinal, que manuscrito é esse?

Este manuscrito é uma carta de Duarte de Meneses, Vice-Rei da Índia, ao Daimyō do Japão, Toyotomi Hideyoshi. A transcrição e a adaptação são nossas. A carta, toda cheia de mesuras e cortesias, merecia uma discussão por si só, se pensássemos no contexto histórico, cultural e social em que foi escrita. Segundo fontes de história japonesa, ao contrário do que a carta faz parecer, Hideyoshi era extremamente hostil aos cristãos. Supõe-se, então, que Duarte de Meneses oferecia-lhe presentes como forma de tentar intercedes pelos missionários portugueses que lá iam pregar. Mas há ainda mais coisa que faz deste documento uma peça única. E para mim, deveria receber a atenção de todos os heraldistas. Notem a quantidade de insígnias existentes. Pelas minhas contas atuais são seis, deixando de contar as que se repetem.

Contando a História Romana aos Japoneses

No canto superior direito da imagem, há um escudo de vermelho, com uma cruz e a divisa SPQR posta em banda entre dois filetes do mesmo, tudo de ouro. Armas estas que representam tradicionalmente o Senado Romano. Até os dias atuais, estas armas, sem os filetes, são as armas de Roma. 

No canto superior esquerdo, um escudo de azul com um contrachefe cosido de verde, sobre o qual uma loba de sua cor amamenta dois bebês humanos de carnação. Estas armas referem-se à fundação de Roma, e uma versão similar é apresentada, posteriormente. No primeiro Thesouro de Nobreza de Francisco Coelho Mendes, Rei de Armas Índia, produzido cerca de noventa anos depois, veem-se armas similares.

O Heraldry of the World tem uma página dedicada as armas relatadas à Cidade Eterna. Recomendo a visita nos links deste parágrafo.

Mais para o centro da parte superior do manuscrito, vê-se um terceiro escudo, de vermelho, com um raio de ouro, característico da Legião Romana. E há ainda um quarto, de azul, com uma cabeça de leão de ouro. Quanto a este, eu infelizmente não tenho informações. No entanto, se alguém souber de algo, esteja sempre à vontade para entrar na conversa.

Um Brasão para o Vice-Reino da Índia?

Supostas Armas do Vice-Reino da Índia no manuscrito.

Outro brasão do qual eu não tenho notícia anterior ou posterior é o quinto, que aqui aparece nas duas laterais da carta. Eu o leria como um escudo de azul, um crescente de ouro, contendo cinco besantes de ouro, postos em sautor. A interpretação me parece simples aqui. São as quinas de Portugal, acompanhadas por um crescente, símbolo comum no levante. Minha teoria é de que sirvam para representar, ainda que de forma extra-oficial e nunca registrado, o Vice-Reinado da Índia. Pode-se notar muita coisa na imagem ao lado.

O timbre destas armas é de fato, um mistério. Posso perceber figuras como de um elefante e uma tartaruga ou serpente. A minha teoria é que este timbre alude ao mito hindu das criaturas que sustentam o planeta em suas costas: A tartaruga (ou serpente) e o elefante. Mais sobre esse mito, que é de fato pouquíssimo conhecido, eu encontrei no blog Índia, um país místico.

Contatos entre a heráldica ocidental e a “heráldica oriental”

No entanto, ainda que tenhamos passado por Roma e pela mitologia Hindu, não é ainda o fim. A insígnia mais interessante deste manuscrito não é exatamente um brasão. Vejam dentro do C capitular, numa espécie de escudo redondo. E reparem ainda como o próprio C é coroado por um arco adornado de pedras na ponta central.

Na verdade, esta é a representação de um emblema, ou em japonês, mon. O uso de Kamon (Mons clânicos) é bastante comum entre as classes superiores japonesas durante o período Sengoku. Este período, também conhecido como “Era dos Estados Beligerantes”, nos séculos XV e XVI, ficou famoso mundialmente por seus samurais.

E é justamente na época em que Duarte de Meneses está na Índia, como vice-rei, que Toyotomi Hideyoshi é o Shogun mais poderoso do Japão. O emblema que vemos na Carta intenciona representar o mon adotado pelo Clã Toyotomi, que em japonês, é chamado  Go-shichi no kiri (Em tradução livre, paulownia de cinco e sete). Hoje, este mon é utilizado pelo gabinete do Primeiro-Ministro do Japão.

Goshichi no Kiri
Emblema do Primeiro Ministro do Japão.

Galeria de Brasões do Arquivo Nacional

A Galeria de Brasões do Arquivo Nacional está disponível no Flickr, um site de hospedagem de imagens.

Eu não tenho notícia se o Museu Nacional tinha muitas obras heráldicas, porque infelizmente não moro no Rio de Janeiro. Mas a perda do Museu para um trágico incêndio, no mês passado, me fez questionar ainda mais a validade do nosso sistema de arquivos atual, a forma com que arquivamos as coisas.

O que fazer com estes arquivos?

Papel é algo inflamabilíssimo, e deve ser tratado com muito mais cuidado do que os excelentes governantes da nossa querida pátria de 1889 para cá, que tanto se preocupam com a nossa história (e sim, estou sendo completamente irônico) o dispensam. Como ainda não tenho condições de manter um arquivo físico, tenho expandido a nossa Biblioteca sempre que possível, e para hoje, trouxe um conteúdo novo.

O Arquivo Nacional do Brasil disponibilizou recentemente, em sua página no Flickr,  algumas imagens de brasões de seu acervo, dos períodos Colonial e Imperial. Para garantir que isto não seja perdido, caso alguma mudança política venha a afetar o acervo do Arquivo, resolvi fazer, neste humilde pasquim heráldico, uma réplica de tal galeria.

Confiram as imagens da galeria disponibilizadas abaixo.

Brasões do Arquivo Nacional

Com informações da página da International Order Knights of Thunderbolt, uma incomum confraria que apareceu pelo meu feed do Facebook, recentemente.

 

Errata: Eu havia escrito Museu Histórico Nacional. Alertado pelo grande Renato Moreira Gomes, corrijo-me pois, informando que o MHN está “bem”. Quem queimou foi o Museu Nacional.

A nova “nobreza” da internet, novamente

Há três anos eu escrevi sobre a nobreza fake da internet. E hoje decidi falar mais sobre isto, a despeito da opinião desta gente metida a nobre. Sobre uma meia dúzia de cidadãos com delírios de grandeza, que colocaram em suas cabeças que são nobres  titulados e não desistem deste ideal por nada na vida, se afundando mais e mais em suas próprias mentiras e devaneios.

Recordemos. A entrada neste meio de néscios é simples, e nós, heraldistas, temos uma notável parcela de culpa nisto. Eu já falei aqui que brasões de família não existem, mas para cada heraldista correto, há três prostituindo a heráldica, abusando dela para vender chaveiros, canecas e quadros.

Antes de prosseguir, um aparte, porque os ânimos andam muito exaltados na internet. Antes que os defensores das lojinhas de brasões cheguem aqui, em polvorosa, dizendo que eu não respeito o livre-comércio, que eu não respeito a arte e o trabalho alheio: Eu não tenho nada contra quem vende quadros, chaveiros e canecas com brasões.

Mas eu tenho muito contra quem vende heráldica falsa, que para além de enganar o incauto que não sabe da ciência heroica, ainda desrespeita a heráldica e todos os bons heraldistas, vendendo mentiras. Pessoas como estas sequer são aceitas no grupo deste blog.

Mas voltando ao assunto anterior:

Quem é a Nobreza Fake?

É perfeitamente compreensível que as pessoas queiram ser ou parecer mais nobres.

Não há demérito nenhum em querer exibir um título, desde que você o adquira por meios lícitos, morais e não inventando um título falso, o que é de péssimo gosto e ainda pode levar você para a cadeia, por falsidade ideológica.

Estas pessoas, usualmente, querem ser nobres a qualquer custo, e começam a adicionar sobrenomes nobres ou estrangeiros, aos seus próprios nomes. É um von aqui, um Palaiologos acolá, uma denominação territorial medieval, ou mesmo inventada, como Rei dos Visigodos da Casa Alexandrina Comnênia da Beócia Inferior.

E qual a primeira coisa que fazem? Exatamente. Inventar um brasão. Como se um brasão fosse alguma prova de nobreza. E começam a compartilhar o dito brasão, como se ele fosse uma prova definitiva de bom nascimento.

Vamos lembrar. Na primeira publicação sobre este tema, trouxe algumas palavras do renomado heraldista espanhol Francisco Piferrer (1858, p. 15):

Sobre a Nobreza. "Tratado de Heráldica y Blasón", Página 5. Disponível na Biblioteca.

15. Os títulos, timbres, insígnias e brasões dão, por certo, realce à nobreza; mas não são necessários, nem por si sós são suficientes para conceder nobreza. O nobre sem valor nem virtude, que se pavoneia com seus timbres e brasões, deixa de ser nobre; é um homem vulgar e plebeu. Ao contrário, por mais humilde que seja sua posição, é verdadeiramente nobre o homem que é valente e virtuoso.

Ou seja, estas pessoas não são nobres porque tem um brasão. Se assim fosse, eu também seria um nobre, porque eu tenho um brasão pessoal. São só tolos em busca de autopromoção e algum status social, mesmo este, mais falso que nota de trinta, alimentado por perfis fakes e por enganar pessoas, geralmente de mais idade ou menos estudo.

Felizmente, há vários espaços na internet onde estas pessoas recebem o que verdadeiramente merecem, reprovação e sátira. Em especial, recomendo o grupo Realeza, nobreza e protocolo. Lá, esses nobres são chamados de Desgothados, justamente por estarem fora do Almanach de Gotha, antigo anuário que é referência no que diz respeito a casas reais e nobres ao redor do mundo. Se você ver uma pessoa ostentando um título e achar que é um falsário, basta publicar lá. Os membros serão solícitos em puxar a ficha do fulano, e você até mesmo poderá dar umas boas risadas.

Como um bom heraldista vira um boboca?

Quando um heraldista ou desenhista heráldico aceita “trabalhar” para esta gente, ele passa a fazer parte da mesma fábrica de mentiras. Trabalhar entre aspas, o mais correto seria dizer “ser explorado”, afinal o que mais dizem os tais “nobres” é:

Infelizmente não temos dinheiro, mas poderemos recompensá-lo dignamente por tão nobres feitos em nome da gloriosa restauração do Soberano Trono Espacial da Casa de Seiláosburgo-Semnocionensis da Europa, França e Bahia. Você poderia ser o nosso Rei d’Armas, e desfrutar de todas as nossas reais benesses.

Iludido pelo título de Rei de Armas, que vale menos que uma balinha no mercado do bairro, e encantado por todas as reais benesses, que, reitero, também não valem nada, este heraldista que até tinha potencial, acaba por entrar numa espiral de gabolice que o levará, em algum ponto de sua vida, a uma vergonha absurda de todo o tempo e trabalho que perdeu.

Mas até que isso aconteça, veremos infelizmente muitos destes heraldistas cairem nas garras destes farsantes.

Dicas para heraldistas (e porque não para falsários também?)

Se você foi convidado por uma destas casas, para fazer estas funções, a minha sugestão é que você recuse, por todos os motivos acima.

Casas nobres de verdade pagam por serviços de heraldistas, designers e artistas em geral. O mecenato é uma atividade extremamente nobre, que foi popularizada ao menos desde o século XIV, mas pode-se mesmo considerar que existe desde sempre, afinal ser nobre e ser esteticamente agradável andam lado a lado desde que o mundo é mundo. Se você é um heraldista ou artista heráldico, seja digital ou manual, nunca aceite trabalhar de graça. Além de ser péssimo para o seu bolso, é péssimo para a sua reputação.

Essa dica vale também para os falsários: Se você quer material de qualidade para seguir com a sua brincadeira, pague por ele. Uma mentira passa mais fácil por verdade quando parece verdade. Um certo nobre fake aqui do Brasil gastou um bocado de dinheiro com domínios e hospedagem web para dar um visual mais profissional ao seu devaneio. E funcionou bem, esta pessoa ganhou bastante atenção do que quando só usava blogs gratuitos e brasões malfeitos. Até passou a fazer dinheiro vendendo títulos.

Outra coisa a se ter em mente: Nobres são discretos quanto à sua nobreza. “O nobre que se pavoneia é vulgar e plebeu”, já disse Piferrer. Eles não ficam publicando sobre a sua nobreza no Instagram, eles apenas são nobres, mas eles preferem ser reconhecidos pelo que fazem e consideram importante, como qualquer outra pessoa.

Um príncipe piloto

Um bom exemplo é o Arquiduque Ferdinand von Habsburg, herdeiro da linha de sucessão dos Habsburgos. Ele é piloto de Fórmula 3, e praticamente só fala em Fórmula 3 em suas redes sociais. Nenhuma menção a nobreza, nenhuma menção a sucessão ou política. A figura mais próxima de um brasão é um logotipo que lembra muito vagamente uma águia.

Logotipo de Ferdinand Habsburg, Arquiduque e piloto de corridas.

Em resumo: se você ver um “nobre” se vangloriando todos os seus títulos nas redes sociais, é bem provável que ele não tenha título nenhum. Se você for um nobre Fake, a minha dica é que consiga passatempos mais nobres do que exibir brasões ou falar mal do governo. Sugiro poesia, crítica cultural ou um esporte que tenha fama de nobre, como Pólo, Cricket, Rugby ou Tênis. Política é algo a evitar, pelo cenário em que vivemos.

Mas talvez a maior e mais importante das marcas de um nobre é a ortografia. Eu nunca vi uma publicação de uma Casa Real de verdade ter sequer um erro ortográfico ou fugir à netiqueta. São sempre textos primorosamente escritos, livres de quaisquer erros de escrita, concordância, coesão e coerência. Se você se diz nobre, mas escreve errado e em Caps Lock, você está passando vergonha. Não só como nobre mas como ser humano na internet.

Isto posto, a presença de um nobre na internet pode ser sintetizada em ao menos três máximas:

Discrição, cuidado visual e atenção à escrita. Tendo isto em mente, mesmo se você não quiser parecer um nobre, vai acabar parecendo.

Brasões de Família não existem

O título é auto-explicativo. Mas eu vou repetir, para ajudar a fixar. Brasões de Família não existem. Então não jogue o seu dinheiro no lixo.

A comunidade heráldica internacional é unânime, e nós no Heráldica Brasil também precisamos ser: Brasões são concedidos a pessoas, e não a famílias. O que existe é o brasão pessoal, que é passado de pais para seus filhos através de herança, como um livro, um quadro ou qualquer outra propriedade. Igualmente, isto vale também para os brasões das famílias reinantes nas monarquias modernas. Para a Heráldica, as armas não pertencem à família e muito menos ao estado, mas sim ao monarca como chefe de estado. Afinal governa-se em nome dele. E os seus parentes recebem brasões criados a partir do dele, como em todas as famílias armoriadas. E após a sua morte, as suas armas passam para o seu filho e sucessor no trono.

E como eu sei se tenho direito a um brasão?

Apenas através de pesquisa genealógica você pode descobrir se algum de seus ancestrais recebeu carta de brasão de algum monarca ou colégio heráldico. Caso não encontre, você não possui herança heráldica, o que não é um problema, afinal é o caso da maioria das pessoas. Não possuir parentes armoriados não te impede de criar o seu próprio brasão.

Entretanto, você NÃO PODE usar o brasão de alguém que não tem nenhuma ligação familiar com você. Isso é desonesto, além de ser de péssimo gosto.

O François Velde, idealizador do heraldica.org, cravou uma vez a seguinte máxima:

François Velde, sobre Brasões de Família.
Originalmente publicado no grupo Heráldica Brasil, no Facebook.

Estamos de volta, para mais Heráldica!

Senhoras e senhores, é muito bom estar de volta a publicar, agora no novíssimo Heráldica Brasil.

Nas últimas semanas, estive trabalhando secretamente neste novo blog, dividindo o tempo destinado a ele com o meu novo projeto acadêmico, um blog de crônicas sobre a época medieval chamado Dias do Reino (que também está em fase inicial). Nas próximas semanas, aos pouquinhos, vou adicionar os links e atalhos necessários. Os posts mais visitados do Blog de Armoria também serão transferidos para cá, e depois disso, o Heráldica Brasil começa oficialmente os seus trabalhos, numa roupagem mais madura e mais cuidadosa do que antes.

Minhas armas pessoais por Lee Lumbley

Minhas armas pessoais, desenhadas pelo heraldista americano Lee Lumbley, assinando o retorno.

No último ano, muitas mudanças ocorreram, entre elas o meu retorno à Universidade e o meu primeiro projeto bem-sucedido, o brasão da minha cidade, São Bento, que foi oficializado (logo deve ter uma página sobre ele por aqui). E entre eles veio a oportunidade de adquirir um endereço próprio, e parar de depender do limitado Blogspot.

Como sempre, o blog será fiel aos princípios aos quais eu sempre me propus dentro da heráldica. Como já se sabe, eu não sou um artista heráldico. Eu sou um designer gráfico que vez por outra produz algumas obras heráldicas, quando tem tempo livre. Não vendo e não cobro por obras heráldicas, especialmente porque sei de vários casos de artistas que levaram calote de “clientes bem-intencionados”. Eu que não me arrisco. Outro ponto importante, é que assim como no Blog de Armoria, no Heráldica Brasil também não nos metemos com o pessoal das lojinhas de brasões. Relembrando as palavras do Célebre François Velde, idealizador do heraldica.org:

Qualquer um que afirma poder encontrar suas armas apenas olhando num livro ou numa base de dados, ou é um ignorante ou é um mentiroso.

Por fim, para concluir a tríade das minhas máximas sobre heráldica. No Heráldica Brasil se fornece conhecimento, informação, e vez por outra, desenhos e diversão heráldica. Assim, garantir a veracidade genealógica e o direito do brasão é de inteira responsabilidade de quem busca a informação. Então não venham me perguntar “Qual o meu brasão”, porque isto eu já respondi lá no grupo Heráldica Brasil, no Facebook.

E se você não está lá, sinta-se à vontade para pedir entrada. Apenas não esqueça de responder às perguntas da administração.

Biblioteca no ar

E agora, de volta ao trabalho. Antes de fecharem, deem uma olhada no menu do blog. Há um link para um dos meus sonhos antigos, a Biblioteca do Heráldica Brasil. Já tem alguns volumes disponíveis.

Até a próxima publicação!

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