Fachada do College of Arms, Londres.

College of Arms, Londres. Foto por Georgia Evelyn Stants

O College of Arms, Autoridade Heráldica da Inglaterra, do País de Gales e de boa parte da Commonwealth (Austrália e Nova Zelândia, por exemplo), produz um boletim trimestral com notícias sobre novas armas concedidas ou a conceder, palestras oferecidas por seus Reis de Armas e visitas aos arquivos da instituição. Esta Newsletter é encaminhada por e-mail para todos que subscrevam, e também pode ser acessada no site do College.

Estou tentando cultivar o hábito de ver os meus e-mails mais frequentemente, e para isso, esta newsletter é muito boa, afinal sua periodicidade me dá tempo suficiente para limpar a minha caixa de entrada antes de recebê-lo. Sem mais delongas, ei-lo.

Boletim do College of Arms, 54

Nesta edição, que chegou ao meu e-mail no fim de Abril, constam algumas notas bem interessantes. A primeira seção traz as armas da St. Edward’s School, uma das entidades que faz parte da Universidade de Oxford. Chamou a atenção o fato de os paquifes não serem das cores das armas, o que me causou alguma estranheza. Luís Marques Poliano, em seu Heráldica, nos diz:

Os paquifes são tiras de couro recortadas e coloridas com os esmaltes principais do escudo, caindo do timbre sobre os lados, tendo origem nas “capelinas” que, durante a Idade Média, eram usadas sovre os elmos para evitar o seu excessivo aquecimento pelo sol.

Vera Lúcia Bottrel Tostes (1983, p. 117) corrobora o primeiro, em seu Princípios de Heráldica.

[Os paquifes] No entanto, devem estar nos esmaltes principais do escudo.

E indo mais adiante, Alejandro de Armengol y Pereira (1933, p. 110), no seu Heráldica diz o mesmo, e parece querer reforçá-lo, pois assim o faz três vezes:

“Los lambrequines representam trozos de tela, cortados en forma de hojas, de los colores y metales que entran en la composición del escudo. […] La forma de trozos de tela cortados y volateando, siempre de los mismos esmaltes del escudo, es característica en los lambrequines. Se dejan en forma de plumajes para los nuevos nobles, siempre de los esmaltes del escudo.

Realidades geográficas explicam diferenças estéticas

Entretanto, a heráldica é uma arte, e como arte, a grande chave para compreender isto é recordar que a estética difere de lugar para lugar. Ou seja, o que se faz na heráldica portuguesa não necessariamente se fará na heráldica inglesa. Para comprovar isto, fui em busca de referências em inglês. Charles Boutell (1908, p.136), heraldista inglês do século XIX, descreve os paquifes (em inglês, mantling) da seguinte forma em seu Heraldry:

Mantling, or Lambrequin. A small mantle of some rich materials, attached to the knightly basinet or helm, and worn hanging down. It is usually represented with jagged edges, to represent the cuts to which it would be exposed in actual battle.

Placa de Sir Hugh Stafford, Lord Bourchier. c. 1421

Desta vez não há nenhuma referência a cores. Diz-se apenas “um pequeno manto de ricos materiais.” Percebe-se pois que os mantos são questão de estilo na heráldica inglesa. O que eventualmente eu pude confirmar em Heraldry for Craftsmen and Designers, onde William St. John Hope nos informa que:

 

 

 

 

The usual colour for the mantling, for a long time, has been red, and its lining of ermine or white fur, but there is ample precedence for a difference of treatment, as may be seen in that rich collection of ancient heraldic art, the stall-plates at Windsor.

“A cor usual para os paquifes, por um longo tempo, foi o vermelho, e seu forro, de arminhos ou de peles brancas, mas há ampla precedência para diferenças no tratamento, como pode ser visto naquela rica coleção de placas de cavaleiro em Windsor” (tradução nossa)

Assim, faz sentido considerarmos que, especialmente na era áurea da heráldica inglesa, os paquifes eram vistos como outra peça de indumentária, não precisando combinar com as cores do brasão em si. Enfim, o brasão do St. Edward’s College está conforme às regras mais corretas para a heráldica inglesa.